Eu Li: O Arquivo das crianças Perdidas

Olá!
A resenha de hoje é do livro  Arquivo das crianças Perdidas, de Valeria Luiselli, Editora Alfaguara.

Sinopse
Mesclando a crise familiar com a crise política do país, Arquivo das crianças perdidas mostra uma empatia única com a situação atual. Através de diversas vozes, sons e imagens, Valeria Luiselli cria um romance virtuoso. Uma família viaja de carro de Nova York para o Arizona durante as férias de verão, com o objetivo de chegar até a terra dos Apaches. No carro, eles passam o tempo como podem, com jogos e música, mas no rádio a notícia da “crise da imigração” não para de aparecer. Centenas de crianças cruzam a fronteira do México para os Estados Unidos só para serem presas do outro lado ― ou pior, ficarem perdidas no deserto. Conforme a família passa pelos estados do Tennessee, Oklahoma e Texas, a crise que eles mesmos enfrentam se torna mais clara. Os pais se distanciam cada vez mais, e as crianças ― um menino e uma menina ― são puxadas para o abismo que se abre. Um livro de temática ampla, Arquivo das crianças perdidas reflete a onipresença da “crise da imigração” ao deixá-la como pano de fundo constante ― Luiselli nunca traz a política para o foco de sua narrativa, mas sempre a insere no contexto. Arquivo das crianças perdidas é também uma crítica à tecnologia, uma análise sobre a volta do rádio como importante meio de comunicação, a estética vintage, entre outros. Mas seu maior tema é a escuta: este livro mostra como precisamos escutar tudo a nossa volta para melhor entender o mundo em que vivemos.
Quando eu vi este livro entre os lançamentos disponíveis para a leitura, não pensei duas vezes. Uma sinopse e um tema super atual, despertaram minha vontade de começar logo esta leitura.

Poucos livros me impactaram neste ano como este aqui! Esta foi uma das leituras mais intensas que fiz. Já imaginava que seria um livro denso, mas não imaginava que fosse gostar tanto! Uma leitura visceral, forte e profunda. 

Uma família formada por um casal, cada qual com um filho de um relacionamento anterior. A mãe do menino morreu no seu parto, o pai da menina não acompanha sua vida. Assim forma-se esta família: Mã, Pá, o menino e a menina.

Escrito em forma de diário, cada capítulo é estruturado, mostrando no seu início, sob forma de índice, o conteúdo de cada uma das setes caixas que a família carrega na sua viagem, de Nova York até o Arizona.

A trama mostra a ingenuidade, a ternura, a vivacidade da criança, além da curiosidade natural de cada idade. Como em toda boa viagem de carro que se preze, lá estão as perguntas clássicas: Vai demorar para chegar? Quantos quarteirões faltam? A mãe trata de os distrair com músicas e audiobooks. 

Este aliás é um dos pontos altos do livro, as citações de obras literárias no decorrer da viagem e da trama. Todos os personagens gostam de ler e lêem, inclusive a menina, que lê "o livro sem figuras". Gostei muito desta inferência. Um capítulo fala sobre O Trem dos órfãos e eu li um livro sobre este problema trágico que os EUA vivenciaram no início do século passado

A autora trabalha com uma metáfora muito interessante e ao mesmo tempo triste, conforme a família avança no seu trajeto, maior é o afastamento do casal. As crianças, principalmente o menino, percebe esta delicada situação e tenta consertá-la ao seu modo.

O livro mexeu muito comigo, principalmente o capítulo Cânion do eco. Nele, inacreditáveis 22 páginas intensas, sem ponto, sem parágrafos, "traga" o leitor para as profundezas oníricas de uma situação conflitante e ameaçadora. Li num fôlego só e me sentindo muito estranha. Acho que isso nunca tinha acontecido comigo, durante uma leitura e por isso mesmo me impressionou tanto.

A escrita da Valeria Luiselli é muito, muito bonita. Por vezes potente, por vezes terna e poética. Uma autora jovem, nascida em 1983 e tão madura. Gostei muito também de conhecer os detalhes do seu trabalho de preparação para este livro, como deu forma à narrativa e como trabalhou as vozes dos personagens. Tudo isso ela conta no posfácio.

A capa do livro é belíssima, edição super caprichada da Alfaguara. 424 páginas que devorei e não consegui largar o livro até o seu término. Adorei a diagramação, as fotos que ilustram o texto. Fiz muitas marcações e escolhi algumas para compartilhar aqui.

"Empenhados que estávamos em coletar intimidades com estranhos, devotados a ouvir tão atentamente suas vozes, nunca suspeitamos que o silencio cresceria devagar entre nós dois. Jamais imaginamos que um dia, de alguma forma, teríamos perdido um ao outro em meio à multidão"

"...e finalmente , todas as lacunas de som durante nossos momentos passados sozinhos, colecionando pedaços do mundo do melhor jeito que cada um de nós sabe como coletar. O som de tudo e de todos que um dia nos circundaram, o barulho com que contribuímos e o silêncio que deixamos para trás"
Sobre a autora
Valeria Luiselli é uma escritora mexicana. Além de escrever ensaios e obras de ficção, colabora com outros artistas em projetos multidisciplinares, entre eles um libreto encenado pelo coreógrafo britânico Christopher Wheeldon e o New York City Ballet.

O Arquivo das crianças Perdidas
Autor: Valeria Luiselli
Ano: 2019
Páginas: 424
Editora: Alfaguara
Livro cedido pela editora
Avaliação: 5/5
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